Após mais de 20 anos a trabalhar em consultoria, nomeadamente na gestão de projetos de recrutamento e seleção, na senda de garantir um trabalho de qualidade que faça “brilhar os olhos” dos clientes, ainda hoje sinto a mesma frustração quando um processo de seleção não corre como o desejado. Apesar da bagagem profissional que vamos acumulando e que nos faz relativizar os obstáculos e encontrar forças para reagir, a verdade é que “dói sempre” quando após um grande investimento num trabalho que acreditamos ter sido de qualidade, nos vemos obrigados a começar tudo de novo.

O mercado de trabalho está diferente, os empregadores estão diferentes e, acima de tudo, o universo de potenciais candidatos está diferente na forma como reage às oportunidades de emprego. Este cocktail de variáveis provoca indiscutivelmente uma grande pressão sobre quem tem como missão identificar, atrair, avaliar e selecionar candidatos.

Neste contexto, torna-se fundamental adotar uma estratégia que mitigue os aspetos atrás mencionados para potenciar as hipóteses de sucesso. Com base na minha experiência enquanto representante de empresa especializada em recrutamento/search, partilho alguns princípios que podem alavancar o sucesso num processo de seleção, nomeadamente na relação com as empresas clientes:

  • Conhecer bem a empresa e o enquadramento do processo de seleção: mais do que nunca, na antecâmara de um processo de seleção, é fundamental conhecer-se bem a empresa que pretende recrutar, a sua cultura, o projeto de carreira expectável para a pessoa que vai entrar, o motivo que está por detrás da necessidade, se a necessidade se deve à saída do anterior detentor do posto, qual foi a razão dessa saída, o contexto de negócio atual e futuro da organização e, no final, “embrulhar” esta informação num pitch do projeto que permita criar uma storytelling que cative o universo de potenciais candidatos. Nesta fase, é igualmente fundamental definir-se a vaga em aberto, nomeadamente no que respeita o binómio condições salariais vs. tipologia de perfil. O papel do consultor é fundamental para evitar uma autêntica “caça aos gambozinos”, ajudando a empresa a ajustar as suas expectativas para o processo de seleção;
  • Conhecer bem o negócio e a área para a qual se recruta: naturalmente que conhecer à ‘priori’ uma posição e já ter um track-record anterior no recrutamento de posições similares, é um excelente trunfo para o kick-off de um novo processo. Todavia, nem sempre tal é possível e os tempos atuais colocam-nos cada vez mais perante a necessidade de procurar novas funções (algumas que nem existiam há poucos anos) em novos setores nos quais não existe histórico prévio. Nestes casos é fator crítico de sucesso ter a oportunidade de discutir o perfil diretamente com a área de negócio e saber fazer as perguntas certas: qual o volume de negócios do setor? Qual o organograma? Qual a cadeia de valor/a posição em que se enquadra (na própria empresa e no mercado onde se insere)? Quais são as empresas que gravitam à volta do setor onde se deverá incidir a pesquisa? Quais são os targets/geografias nas quais temos mais hipóteses de encontrar pessoas com o perfil pretendido? Quais os indicadores de sucesso em termos de experiência que se procura num profissional?;
  • Definir a melhor metodologia de pesquisa e avaliação: em função do perfil, nível de senioridade, setor de atividade, zona geográfica da vaga, entre outros, a abordagem de seleção a adotar pode e deve ser ajustada para potenciar o processo. Cada processo pode envolver estratégias de pesquisa diversas, bem como ferramentas de avaliação adequadas. Não se pode pretender utilizar a mesma fórmula para todos os perfis, na expectativa de que corra sempre bem;
  • Manter constante follow-up com a empresa cliente: cada vez mais os processos de seleção apresentam “nuances” ao longo do mesmo, que obrigam invariavelmente à necessidade de ajustar ou mesmo redefinir a estratégia adotada; para tal, é fundamental que se procure um canal aberto de comunicação (empresa consultora – empresa cliente) para evitar surpresas no final. Este follow-up regular (geralmente semanal) permite calibrar expectativas e permite “arrepiar caminho” a tempo, caso seja necessário;
  • Manter constante interação com o universo de potenciais candidatos: na verdade, este é, no meu entender, um dos maiores fatores de sucesso, nomeadamente nos processos de seleção mais difíceis, onde escasseia a amostra de candidatos. O facto de se conseguir criar uma boa relação com a network de candidatos, mesmo com aqueles que não fazem fit com o perfil que procuramos, pode ser a chave do sucesso para “compreender o mercado”, potenciar contactos e chegar a níveis mais profundos de pesquisa que de outra forma seria praticamente impossível;
  • Atitude positiva perante o insucesso: e assim voltamos ao início desta reflexão. Apesar da frustração enorme que se sente quando sentimos que fizemos tudo bem e ainda assim o processo correu mal, é fundamental entender onde é que está o busílis do problema, perceber quais os caminhos onde não se deverá insistir, criar novos compromissos com a empresa cliente (por vezes, torna-se necessário negociar cedências no perfil ideal originalmente definido) e encontrar caminhos alternativos para o sucesso. Não existe uma fórmula mágica e cada caso é um caso, mas da minha experiência na gestão da relação com clientes, é geralmente no rescaldo deste tipo de processos complexos que se alicerçam as bases para as relações de parceria mais duradouras e bem-sucedidas.

Miguel Abreu

Diretor